Prezados Colegas,

1. Uma epidemia de rápida disseminação, com ocorrência de casos graves, com mortes e sem propostas de tratamento para evitar esses desfechos, torna quase natural o surgimento de uma inquietude na busca e proposição de condutas que possam resolver o problema, mesmo que não tenham o rigor científico necessário para que sejam encaradas como seguras ou responsáveis. Podem parecer razoáveis mesmo aquelas que tenham sido testadas cientificamente apenas de forma parcial (em pequenas casuísticas) ou de forma imprópria (sem grupos de comparação), ou fora do paciente (in vitro ou em cultura de secreções), ou até mesmo por meio de desfechos intermediários (não clínicos e centrados no vírus).

2. Contudo, também é de se compreender que o médico, em sua missão de evitar o desfecho da morte inevitável, procure prescrever medicações minimamente testadas ou descritas nessa fase aguda da epidemia que não aumentem o risco e que tenham potencial para reduzi-lo.



3. É nesse cenário que se encaixa a recente proposta de uso da Hidroxicloroquina (associada ou não à Azitromicina) e seu efeito nos pacientes com quadro de COVID-19. 

4. Nenhuma agência regulatória mundial liberou ou recomendou seu uso por dispor de pouca ou quase nenhuma evidência de seu benefício a esses pacientes, o que obviamente poderá ocorrer nos próximos dias frente à enorme geração de evidência disponibilizada nas bases de informação científica. Mas hoje, não há evidência científica ou segurança que permita, de forma responsável classificar este procedimento como aconselhável para tratamento dos pacientes de coronavírus.

5. Nesse contexto, devemos ter em mente dois elementos regulatórios naturais de nossa prática:

a) Prescrição compreensiva, autônoma e compassiva para pacientes exclusivamente graves, cuja evolução claramente aponta para o desfecho de morte independente de todas as formas de tratamento utilizadas;

b) Nosso papel fundamental de educativamente coibir abusos e absurdos de uso de tais condutas profilaticamente ou em pacientes não graves, submetendo-os a riscos desnecessários e não acompanhados de benefício.

6. Até que os benefícios e a segurança do uso destas medicações em pacientes com COVID-19 sejam cientificamente comprovados de maneira consistente, a AMB considera que essa modalidade de tratamento deve ser mantida em ambiente experimental seguindo toda a legislação da Comissão Nacional de Ética e Pesquisa (CONEP) e dos demais órgãos reguladores da pesquisa médica no Brasil (ANVISA, CFM e Ministério da Saúde).

Atenciosamente, Lincoln Lopes Ferreira
Presidente da AMB