Acabamos de usufruir de dias felizes e em clima fraternal. No Brasil, até por sua predominante veia cristã, o Natal enseja a confraternização, a união, o perdão e a paz, especialmente a de espírito.

Agora estamos às vésperas de virada de mais um ano. Tradicionalmente, vivemos momentos de reflexão. Hora do balanço do que houve de positivo ou negativo e de realinhar. Hora de planejar 2018, para que seja melhor, mais alvissareiro. 



Peço licença para usar algumas linhas desse nosso espaço para refletir sobre o País, e para pensar o que queremos para os próximos 365 dias e o futuro. Você e eu sabemos que 2017 foi duro: crises econômica e política, desemprego, queda do poder de compra, redução da capacidade produtiva, só para citar poucos problemas. Caiu a inflação, é verdade, mas como consequência do despencar da demanda, pois não há dinheiro no bolso do cidadão, quanto mais sobrando. 

Sem querer fazer a linha conformista, compreendo que se trata de uma etapa complicada somente; temos condição de superá-la e entrar em uma esfera de crescimento. Mas há um porém nesta história toda: isso só ocorrerá se extirpamos a maior chaga de 2017, aliás, um mal recorrente, que aos poucos leva o Brasil ao precipício: a corrupção. 

Precisamos reagir com firmeza aos pactos espúrios entre certos políticos e alguns maus empresários que provocam desvios milionários e tiram da sociedade a possibilidade de justiça e progresso. É impossível se tornar um país de primeiro mundo com o atual estado de leniência. 

De acordo com estudo da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a cada ano, cerca de R$ 100 bilhões são perdidos com as práticas ilegais, representando até 2,3% do Produto Interno Bruto. Veja o que ocorre na área da saúde, responsável por 9,5% do PIB: todos os dias temos no noticiário casos de fraudes bilionárias. Os recursos vazam em proporção escandalosa, mesmo com a Polícia Federal realizando inúmeras operações de caça à bandidagem, como a Marcapasso, Monte Carlo, Saúde, Sanguessuga e Vampiro e por aí vai. 

Estima-se que, corrupção, má gestão, burocracia e incompetência comprometam cerca de 50% dos recursos destinados ao setor. O resultado, além de enriquecimento ilícito de uns poucos, de estados municípios quebrando, e do endividamento da União, são hospitais fechando leitos, reduzindo cirurgias, acesso comprometido, doentes jogados em maca à espera de assistência. Enfim, todo o tipo de ultraje aos princípios fundamentais do homem. 

Assim, um dos modelos mais perfeitos do planeta, ao menos teoricamente, no campo da saúde, o SUS é inviabilizado e desmantelado sob nossos olhos. Ganham outra vez grupos gananciosos que, no setor suplementar, tentam criar planos de saúde sem garantias aos pacientes e ainda não ressarcem os cofres do Sistema Único de Saúde, quando da utilização por parte de seus clientes.

Combater este estado de coisas deve fazer parte da agenda de todos que sonham com um País digno e um futuro melhor já, em 2018, 2019, 2020... A virada de mais um ano nos propicia a reflexão, é verdade. Mas que ela venha para ficar, que seja diária e nos encha de brio. 

Não podemos mais esperar que outrem modelem o Brasil que almejamos. Essa tarefa só será bem cumprida se cada um de nós assumir o papel de ator, de artista principal. Não nos faltam caminhos para chegar a um final feliz: temos o poder da indignação, a capacidade de protesto e o voto. Façamos nossa parte com amor, ética e inteligência. Feliz 2018.


Antonio Carlos Lopes, presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica

*Artigo publicado no Diário do Grande ABC em 01/01/2018