A formação médica na atualidade

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Abrão José Cury Junior

Resumo

Há 50 anos tínhamos cerca de 90 faculdades de
medicina no país e um total de 9.000 vagas. Logo
formavam-se 9.000 médicos por ano quando éramos
perto de 90 milhões de habitantes. Nossa população
hoje é próxima de 220 milhões, ou seja, 2 vezes e meia
maior, mas formamos 50.000 médicos ao ano, ou seja,
quase 6 vezes mais do que naquela época. Muitas coisas
mudaram nesse teatro. Apesar dos avanços tecnológicos
e os conhecimentos terem proporcionado
ganhos fantásticos desde a possibilidade de diagnóstico
até as intervenções terapêuticas, a verdade é que a
formação médica não sinaliza a mesma progressão. O
crescimento exponencial de faculdades de medicina no
país e a falta de personalização do ensino certamente
são os fatores responsáveis por esta dicotomia entre
benefícios dos recursos tecnológicos, aprimoramento
do conhecimento médico e fragilidade da formação
profissional.
Em todo o país estima-se um número insuficiente
de vagas para residência médica que pudesse atender
a esse número de médicos que anualmente se formam.
São 15.000 vagas mais qualificadas em todo o
território nacional. Vale ressaltar que se a residência
já era importante há 50 anos, hoje é ainda mais não só
importante, como indispensável à formação médica. O
aluno da graduação não tem, na maioria das faculdades,
a oportunidade de ter suas atividades práticas em
nenhuma área exercida, especialmente nos cursos que
nem hospital escola tem e que simplesmente despacham
os seus internos para hospitais que na maioria
não têm a menor estrutura acadêmica para recebê- los.
Formar o médico vai muito além de dar aulas e
cobrar conhecimento em provas. Demanda treinamento
do jovem (que ainda é a maioria dos alunos)
para lidar com as pessoas em momentos difíceis de
sofrimento; demanda treiná-los a desenvolverem empatia
e compaixão. Demanda estimulá-los ao estudo
permanente e aos que forem para as áreas cirúrgicas,
demanda treiná-los na especialidade bem como para
aos que optarem pelas áreas de imagem e diagnóstico
laboratorial ou de anatomopatologia.
Com o que temos de informações e conhecimentos
hoje fica óbvio que os 6 anos do curso já são insuficientes
para que ao final da graduação o recém-formado possa
sair atuando. Fica claro, também, que nas instituições
sem estrutura acadêmica para conferir um adequado
internato isso fica ainda mais deficitário. A residência
médica em instituições devidamente estruturadas e
reconhecidas pelas sociedades de especialidades se
constituem no complemento da formação médica e
se assim não for feito, enfrentaremos uma situação
desastrosa: médicos mal-formados, desde a graduação,
e que se auto intitulam generalistas e habilitados a
atender em qualquer situação, em qualquer área.
A população arcará com o ônus dessa distorção
que vem se avolumando em nosso país. Teremos uma
prática médica de alta suspeitabilidade.
Uma elite médica (os mais bem formados) cuidando
de uma elite da população (os mais abastados). Assim,
ao contrário do que os discurseiros a favor desta
anomalia afirmam, o que teremos é uma prática médica
ineficaz e arriscada oferecida às populações mais
desprotegidas.
Precisamos repensar no que fazer para melhorar de
fato e qualitativamente a formação dos nossos médicos
não só do futuro, mas já no presente.

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Editorial