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As entidades médicas se posicionaram desde a primeira hora de forma crítica em relação ao programa Mais Médicos, do Governo Federal. Todas sempre lutaram, e prosseguirão lutando, por assistência integral e universal aos brasileiros. O problema não é ter mais médicos ou menos médicos. O que se questiona é a ampla distância que existe entre quantidade e qualidade.  O programa Mais Médicos não ataca nem de longe as falhas estruturais do Sistema Único de Saúde. Ao contrário. É unânime que uma das principais chagas do SUS é o subfinanciamento, mas o governo e o Ministério da Saúde atuaram de forma enérgica para derrubar a proposta de aumento da destinação de recursos federais à saúde quando da regulamentação da Emenda Constitucional 29.



O resultado está nas periferias, nas regiões remotas, entre outros pontos. Em todo o país, médicos trabalham em condições precárias e degradantes única e exclusivamente por compromisso com os pacientes. Para honrar o juramento de Hipócrates, enfrentam e atendem em unidades com infiltrações, rachaduras, mofo, estruturas enferrujadas, equipamentos quebrados, salas improvisadas, banheiros interditados e pacientes no chão, conforme o noticiado por diversos veículos de comunicação nas últimas semanas.

Uma frente de prefeitos que deu sustentação à criação do programa Mais Médicos, sob o argumento que não há profissionais nas localidades mais afastadas do Brasil, só deixou de colocar que os próprios executivos municipais são responsáveis pelas distorções geográficas. Sempre que chamam os profissionais de medicina, recebem resposta positiva. Porém, com frequência não pagam salários combinados, praticamente expulsando os médicos e os utilizando para fins eleitoreiros. Afinal, todos precisamos sobreviver. 

Assim, entre desatinos da gestão e financiamento inadequado, o governo busca soluções eleitoreiras e marqueteiras. O Mais Médicos é uma espécie de pão e circo. Não se preocupa com a qualidade e aposta na quantidade. Prevê a vinda de profissionais formados fora do Brasil sem um exame para comprovar a capacitação e a criação de serviço civil obrigatório para os acadêmicos de Medicina.

Nem de longe é a solução para a saúde pública do país. Para mudar o sistema público, o investimento deve ser, no princípio de todo o ciclo, na formação do médico. Como já frisei, é notório que no SUS faltam recursos básicos para o atendimento. Mas o descaso de nossos governantes atinge também a esfera da educação. Nos últimos tempos, temos acompanhado a proliferação sem controle de escolas médicas. Instituições sem infraestrutura, nem corpo docente qualificado e carência na preceptoria, que visam somente à atenção básica, e muito mal.

Para mascarar a precariedade estrutural das unidades de saúde, as autoridades responsabilizam os médicos pelas falhas no processo de interiorização da assistência. No entanto, é preciso se entender que o exercício da Medicina exige equipamentos e atualização constante, pois é dessa forma que educamos nossos alunos. Médico sozinho não faz medicina. Muito menos examinando e apalpando o doente em cima de uma rede, desconsiderando a importância da anamnese que é conduta essencial na relação médico-paciente.

Devido à deficiência estrutural, o que exigirá tempo para ser melhorado, é preciso formar profissionais que consigam trabalhar sem tecnologia avançada ao seu lado. Necessitaríamos de um treinamento que poderia ser implantado nos cursos de medicina como complemento, mas com foco na formação integral, tendo o paciente como prioridade. Um médico para pessoas.

Diferentemente do que propõe o governo, não devemos formar o médico para o SUS ou para rede privada, e sim formar um médico para tratar o doente, seja ele quem for, independente de classe social e local de nascimento.

Até agora, o Mais Médicos não conseguiu fixar adequadamente nem uma centena de profissionais para a assistência. Mas já deu muito palanque e visibilidade para o governo. O mesmo que não moveu uma palha para que sua pasta recebesse uma injeção de recursos pela Emenda 29 e, em 2012, deixou de investir bilhões do orçamento destinado à saúde, conforme relatório do Tribunal de Contas da própria União. 

Alimentamos a esperança de que este governo, para o qual demos nosso apoio, faria muito em benefício da Saúde. Mas não podemos deixar de nos perguntar: por que essa proposta afoita de alocar médicos estrangeiros em regiões afastadas há apenas um ano das eleições? Até os mais alheios aos problemas na área da Saúde e Educação conseguem concluir que o programa “Mais Médicos” verdadeiramente é a assinatura do atestado de que nada realmente foi feito em todos esses anos.

Antonio Carlos Lopes é presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica