Micro-Organismos |
n |
% |
Gardnerella vaginalis |
158 |
20,6 |
Candida spp |
93 |
12,2 |
Mobiluncus spp |
28 |
3,7 |
Trichomonas vaginalis |
19 |
2,5 |
n = frequência absoluta, % frequência relativa.
A associação de micro-organismos teve baixa frequência, pois houve 12 casos de Gardnerella vaginalis + Mobiluncus spp (4,0%), 06 casos de Candida spp + Gardnerella vaginalis (2,01%) e Candida spp + Trichomonas vaginalis foram responsáveis por dois casos (0,67%).
Se levar em consideração apenas VB, o percentual foi de 24,3% pois os esfregaços submetidos ao método de Gram evidenciaram a presença dos bacilos curvos Gram-negativos e bacilos curtos Gram variáveis em 186 casos de VB, diagnosticada pelo escore (Tabela 2). Foram avaliados pelo escore de Nugent e todos estes casos ficaram com índices entre 7 e 10, com maior proporção de casos com escore 10 e 8 (Tabela 3).
Tabela 2 – Critérios diagnósticos de Nugent para vaginose bacteriana.
A. Lactobacillus acidophilus (bacilos Gram-positivos) |
B. Gardnerella vaginalis e espécies bacteroides (bacilos curtos Gram-variáveis) |
C. Mobiluncus sp (bacilos curvos Gram-negativos ou variáveis) |
Escore para cada um dos morfotipos |
Zero = sem morfotipos no campo de imersão (1000X) |
1+ = menos que um morfotipo por campo de imersão (1000X) |
2+ = um a quatro morfotipos por campo de imersão (1000X) |
3+ = cinco a 30 morfotipos por campo de imersão (1000X) |
4+ = mais que 30 morfotipos por campo de imersão (1000X) |
A soma dos pontos dá o escore final, ou seja, A + B + C: 0 a 3 = normal, 4 a 6 = intermediário, 7 a 10 = vaginose bacteriana.
Tabela 3 – Leucocitose observada em casos de vaginose bacteriana em relação ao escore de Nugent avaliado em esfregaços corados por método de Gram (n = 186).
Escores de Nugent |
Com Leucocitose (n) |
Sem Leucocitose (n) |
7 |
11 |
10 |
8 |
16 |
45 |
9 |
28 |
10 |
10 |
31 |
35 |
Total |
86 |
100 |
Teste Qui-quadrado = 21,672, p = 0,0002.
DISCUSSÃO
Na puberdade há níveis elevados de estrogênio, tanto plasmático quanto tecidual, que aumenta os níveis de glicogênio das células epiteliais. O metabolismo de glicogênio por algumas espécies de Lactobacillus produz ácido lático, resultando no pH normal da vagina de 3,8 a 4,2, faixa de difícil crescimento de Gardnerella vaginalis e anaeróbios12.
Além disto, algumas espécies de Lactobacillus produzem toxinas microbianas como peróxido de hidrogênio, que inibe o crescimento de vários micro-organismos patogênicos. A vaginose bacteriana ocorre quando há diminuição do número de Lactobacillus, diminuindo a produção de ácido lático, resultando em aumento de pH. Este aumento favorece o crescimento de anaeróbios e Gardnerella vaginalis. Com o aumento do número destes micro-organismos, há a produção de ácidos orgânicos e formação de aminas pela degradação de proteínas. Esta combinação causa esfoliação das células epiteliais da parede vaginal, resultando na formação de exsudato não inflamatório13. Entre as possíveis causas da diminuição dos Lactobacillus estão a administração de antibióticos, medicação, duchas vaginais e DST.
A elevada incidência de VB na adolescência pode ser devido aos altos níveis hormonais, que estariam relacionados à etiopatogenia da doença. Outra explicação para a maior frequência da VB nessa faixa etária seria a coexistência de fatores de risco, como o início precoce da atividade sexual, uso de dispositivo DIU e de anticoncepcional oral, bem como maior número de parceiros sexuais14. Entretanto, no presente estudo tais dados não foram pesquisados por se tratar de um levantamento apenas dos dados laboratoriais.
Sendo a VB a alteração do ecossistema caracterizada por uma quantidade anormal de bactérias predominantemente anaeróbicas (lactobacilos ausentes ou diminuídos), a Gardnerella vaginalis pode prevalecer em alguns casos, porém há outras bactérias anaeróbias facultativas Gram-negativas e aeróbias Gram-positivas inclusive micoplasmas. Os anaeróbios são bacteroides, peptoestreptococo, Mobiluncus spp., S. agalactiae e os anaeróbios facultativos Gram-negativos residentes na vagina e constituem o principal componente das infecções polimicrobianas dos tecidos moles, como é o caso da endometrite pós-parto15,16. A VB é muito importante como entidade clínica, porque predispõe à doença inflamatória pélvica17.
A candidíase vaginal é uma infecção causada por um fungo comensal habitante da mucosa vaginal e digestiva que cresce quando o meio torna-se favorável ao seu desenvolvimento. Cerca de 80% a 90% são devidos à Candida albicans. Por fazer parte em até 50% da flora endógena das mulheres assintomáticas, a relação sexual não é considerada o principal meio de transmissão18. Porém, por uma série de condições adversas e, principalmente, quando há alteração da flora vaginal normal, com diminuição dos lactobacilos de Döderlein e alteração de pH vaginal, a Candida spp pode vir a proliferar, favorecendo o aparecimento de vulvovaginite sendo também importante na etiologia da VB19. Outro agente etiológico comumente encontrado nos exames laboratoriais da secreção vaginal é o Trichomonas vaginalis. Este protozoário flagelado possui como reservatório a cérvice uterina, a vagina e a uretra18. O corrimento vaginal profuso apresentando, algumas vezes, odor fétido é referido pela maior parte das pacientes com tricomoníase, considerada uma vulvovaginite e DST20.
A esperada leucopenia nos casos de vaginose bacteriana não foi constante. Embora a inibição da quimiotaxia produzida pelo ácido succínico e, em menor escala, pelo ácido acético possa ocorrer nos casos de anaerobiose vaginal, principalmente associados a Prevotella e Mobiluncus, complexas correlações, envolvendo citocinas, impedem que haja constância da associação entre a população microbiológica e a leucopenia21,22. Tal fato traz uma controvérsia recentemente levantada por Demirezen23 de que os casos com leucocitose, portanto, citologicamente uma vaginite, não deveriam ser considerados realmente uma vaginose. Foi interessante observar também que escore de Nugent nos seus extremos não mostra diferença na concentração leucocitária, ao contrário dos escores 8 e 9 em que se observa diferença significante quanto a ocorrências de leucocitose.
CONCLUSÃO
Com base nos dados apresentados, concluiu-se que a prevalência de VB foi maior na faixa etária de menores de 20 anos com aproximadamente 39% das amostras positivas para presença de micro-organismos potencialmente patogênicos. Se levar em consideração apenas VB, o percentual foi de apenas 24,3% com baixa associação entre candidíase e tricomoníase. O número de leucócitos variou, mas a leucopenia foi mais frequente que a leucocitose.
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1. Aluna de Enfermagem do Centro Universitário do Maranhão (UNICEUMA). São Luis, MA, Brasil
2. Professor Doutor do Mestrado em Biologia Parasitária do Centro Universitário do Maranhão. São Luis, MA, Brasil
Apresentado em 23 de agosto de 2010
Aceito para publicação em 01 de novembro de 2011
Endereço para correspondência:
Dra. Patricia de Maria Silva Figueiredo
Av. Josué Montello 01 – Renascença II
65075-120 São Luís, MA.
E-mail: figueiredo.patricia@gmail.com
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Artigo Original